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sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Anjos Caídos


Em estádios de futebol, costuma existir um espaço chamado "Tribuna de Honra". Lá, entram, gratuitamente, as "autoridades". Alguns cinemas permitem acesso livre a auditores fiscais, delegados, defensores, juízes, promotores, entre outros. Eventos destas mesmas categorias, às vezes, são patrocinados por bancos ou planos de saúde. Torneios de golfe do judiciário são patrocinado por grandes escritórios de advocacia. Os mesmos escritórios dão brindes de fim de ano aos julgadores. A lista poderia prosseguir.

Quando se questiona a existência de um suposto conflito de interesses, argumenta-se que as autoridades são dignas, honradas, nobres e não se corromperiam. As empresas, por sua vez, saberiam que se tratam de categorias com idoneidade moral, acima de qualquer suspeita. Jamais estariam "comprando" a simpatia de quem poderia investigá-las, processá-las, acusá-las, julgá-las, etc. Deste modo, por mero reconhecimento do bem que as autoridades fazem à sociedade, sentem-se lisonjeadas por oferecer-lhes alguns almoços grátis.

Curioso e interessado na evolução da humanidade, resolvi verificar como são selecionados esses mestres da virtude. Seria um conhecimento útil até para aplicar em atividades cotidianas, como, por exemplo, a escolha de amizades, de professores, de prestadores de serviços, etc. Descobri, então, que as almas superiores são pinçadas através de concursos, em que se avaliam suas qualidades mais importantes. Bastaria, então, verificar os conhecimentos exigidos e a fórmula estaria pronta! Simples e eficaz!

Entrei no site de uma empresa especializada em descobrir os budas modernos (http://www.cespe.unb.br) e fui procurar editais de concursos. Comecei pela minha instituição favorita e constatei que para ser defensor público na Bahia é preciso dominar os seguintes "Direitos":  civil, processual civil,empresarial, penal, processual penal, constitucional, administrativo, da criança e adolescente, do idoso, do consumidor, humanos, previdenciário, difusos e coletivos. Não entendi a lógica. Como se depreende daí que eles são santos?
Resolvi analisar o que se perquire para escolher um juiz federal da 1ª Região. Eram quase os mesmos "Direitos". Saíam 3 ( criança e adolescente, direitos humanos e difusos e coletivos) e entravam 4 (financeiro e tributário, ambiental, internacional e econômico). Além disto, exigia-se noções de sociologia do direito, psicologia judiciária, filosofia e teoria geral do direito. Permanecia o mistério. Qual o segredo, meu Deus?

Minhas esperanças de achar o mapa da mina da ética e hombridade estavam se esvaindo, mas fiz uma última tentativa. Optei por investigar o que seria necessário saber para virar promotor do Espírito Santo. Desta vez, não havia como falhar, tanto o cargo como o nome do Estado têm um quê de divindade. Porém, para a minha imensa frustração, é a mesma coisa que para ser Defensor na Bahia. Nada de novo...

Como se vê, basta decorar um monte de leis e princípios jurídicos. Não tem nenhum teste de generosidade, de resistência às tentações, de humildade, de parcimônia, de coragem, de lealdade ou de sabedoria. Cheguei, então, a uma conclusão que muito me chocou: os detentores dos cargos são pessoas como outras quaisquer. São singelos seres humanos e como tais imperfeitos, vaidosos, egoístas, ambiciosos e oportunistas. 

Não existe diferença significativa nenhuma entre um advogado particular, um jornalista, um cambista, um marceneiro, um auditor fiscal, um defensor, um delegado, um deputado, um mecânico, um juiz, um policial, um presidente, um procurador da fazenda ou um promotor. O paletó, a farda ou a toga, assim como o macacão, a calça surrada ou o traje de banho, não outorgam nobreza a qualquer um deles.

Em outras palavras, não há mentira maior que a presunção de correção dos atos oficiais. Só nos resta, então, a desconfiança recíproca. Não existe "parceria". Há, sim, pessoas mais ou menos honestas, mas não é um cargo ou uma roupa que asseguram esta qualidade. Infelizmente, somos todos anjos caídos. Nada mais.

3 comentários:

  1. Mas... quem foi que matou a Norma mesmo?

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  2. Ao que tudo indica, foi delegado Batoré.

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  3. Adorei o Blog, sou apaixonada pela Defensoria. Seguindo com muita empolgação, parabéns pelos textos ;)
    Natalia.

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