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quinta-feira, 30 de junho de 2011

Mudanças na Remição de Pena


Nova lei 12433 traz mudanças importantes, na remição de pena. Na primeira leitura, destaco o seguinte.

a) Agora, é a lei quem reconhece a remição por estudo e não apenas a jurisprudência.

b) Na remição por estudo, cada 12 horas significam 1 dia de pena remida. A jurisprudência sempre entendeu que seriam 18.

É algo que sempre questionei. A fixação das 18 horas se devia ao fato de que, segundo a LEP, a carga horária diária de trabalho, pra fins de remição devia ser de 06 a 08 horas. 3 dias x 6 horas = 18 horas. Sempre questionei isto, pois, pra mim, estudo e trabalho são diferentes por natureza. O mais razoável era considerar 04 horas de estudo como 1 dia, seguindo a carga horária do ensino fundamental. Assim, 03 dias x 04 horas = 12 horas.

Eu pensava como os legisladores, mas nunca vi, pessoalmente, um juiz concordar com isto. Agora que não sou só eu, porém, todos vão passar a achar muito lógico.

c) Em regime aberto e em livramento condicional também existe a remição por estudo (novo § 6º do artigo 126 da LEP).

Excelente medida, para incentivar a permanência na escola que, cá entre nós, é muito mais importante que o exercício de sub-empregos.

d) Remição também na prisão provisória.

Outra razão para acabar com a obscenidade das prisões em delegacias.

e) Acréscimo de 1/3 na pena remida, em caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior.

Bacana, pois apresenta alguma vantagem mais sensível ao preso, do estudo em relação ao trabalho na faxina, ou na costura de bolas.

f) Em caso de falta grave, o juiz poderá (e não deverá) revogar até (ou seja, no máximo) 1/3 da pena remida ( e não mais o total). Neste caso, embora haja uma contradição com a nova redação do artigo 128, que diz que pena remida é pena cumprida, pelo menos há um avanço.

No geral, faltou coragem e coerência para retirar completamente a vinculação da remição à falta grave. Como diz Daniel Nicory, quando alguém comete uma "falta" fora do trabalho ou estudo e é punido na remição, é castigado justamente onde "se comportou bem".

Faltou também reconhecer expressamente a consequência óbvia de o Estado não cumprir a sua obrigação de proporcionar o trabalho e o estudo: a remição, mesmo sem o efetivo exercício das atividades, como bem defende Leonardo Toledo.

Além disto, cabe perguntar que tipo de trabalho e que tipo de estudo serão oferecidos? Libertadores ou controladores?

Mas, ainda assim, houve uma melhora.
Segue a lei.

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI Nº 12.433, DE 29 DE JUNHO DE 2011.
 Altera a Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), para dispor sobre a remição de parte do tempo de execução da pena por estudo ou por trabalho.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o  Os arts. 126, 127, 128 e 129 da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passam a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 126.  O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.
§ 1o  A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:
I - 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar - atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional - divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;
II - 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho.
§ 2o  As atividades de estudo a que se refere o § 1o deste artigo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados.
§ 3o  Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem.
§ 4o  O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição.
§ 5o  O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação.
§ 6o  O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de educação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1o deste artigo.
§ 7o  O disposto neste artigo aplica-se às hipóteses de prisão cautelar.
§ 8o  A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa.” (NR)
“Art. 127.  Em caso de falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 (um terço) do tempo remido, observado o disposto no art. 57, recomeçando a contagem a partir da data da infração disciplinar.” (NR)
“Art. 128.  O tempo remido será computado como pena cumprida, para todos os efeitos.” (NR)
“Art. 129.  A autoridade administrativa encaminhará mensalmente ao juízo da execução cópia do registro de todos os condenados que estejam trabalhando ou estudando, com informação dos dias de trabalho ou das horas de frequência escolar ou de atividades de ensino de cada um deles.
§ 1o  O condenado autorizado a estudar fora do estabelecimento penal deverá comprovar mensalmente, por meio de declaração da respectiva unidade de ensino, a frequência e o aproveitamento escolar.
§ 2o  Ao condenado dar-se-á a relação de seus dias remidos.” (NR)
Art. 2o  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 29 de junho de 2011; 190o da Independência e 123o da República.
DILMA ROUSSEFF
José Eduardo Cardozo
Fernando Haddad

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Pensando e Seguindo 1. Gerivaldo Neiva

Quando criei este blog, queria chamá-lo de "Pensando e Andando". A idéia era propor reflexões e críticas, sobre coisas que parecem impossíveis de mudar, mas sem se permitir parar por causa dos obstáculos. Depois, surgiram obstáculos que eu não esperava, de onde eu não esperava e com armas que eu não esperava. Mas, não paramos.

Infelizmente, o nome não estava disponível e decidi trocar o "andando" pelo "seguindo". Sem querer, acertei na mosca. Eu me arrisquei a escrever uma página na internet, sem entender nada de computação, de tecnologia e de redes sociais. Não sabia o significado de "seguir" alguém no twitter ( nem sabia direito o que era twitter), ou seguir um blog. Na verdade, a idéia de "seguidores" me lembrava messianismo e, por isto, me assustava.

Entendi que o novo assusta até que começamos a compreendê-lo. Imaginem como foi a chegada da geladeira, onde quase não havia água. Com os blogs, o twitter e, agora, o facebook, estou aprendendo muito e muito rapidamente. Conheço e dialogo com pessoas que nunca vi pessoalmente, mas que defendem posições surpreendentes e enriquecedoras. "Seguir" alguém neste novo mundo não é ser liderado, mas se permitir o debate de uma forma inimaginável há alguns anos.

Por tudo isto, iniciarei uma série de reprodução de textos ( ou, quem sabe, vídeos) de blogs que leio. Não são necessariamente os melhores "posts" de lá, mas são alguns que me marcaram, por alguma razão. É uma homenagem a pensadores digitais que me influenciam, me divertem, me emocionam e me questionam. Obrigado aos craques. Vou pensando e vou seguindo.
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O primeiro a ser citado é aquele que, pra mim, melhor domina a linguagem e o espaço dos blogs. Trata-se do juiz da pequena Conceição de Coité, no interior da Bahia: Gerivaldo Neiva. Em primeiro lugar, ele prova que, no novo mundo, você não precisa estar perto do poder para se destacar e fazer valer seus pensamentos. Sem sair de Coité, o cara ( já houve quem pensasse por aqui ser melhor ser chamado de "sentenciado" do que de "cara") fez fama no Brasil.

Em segundo lugar faz análises extremamente inteligentes sobre os diversos problemas que se apresentam. Corajoso, democrático, sensível, cativante  e humano, essencialmente humano.

Dentre as inúmeras crônicas e sentenças que se destacam, fiquei com o seguinte (original aqui):

"

Gerivaldo Alves Neiva *

- Você sabe com quem está falando?
Coitado do interlocutor: será um delegado, um juiz, um promotor? Valha-me Deus!
Esta expressão demonstra, sobretudo, o autoritarismo e a arrogância dos agentes públicos deste nosso país. Muitas vezes, é usada até mesmo por filho, esposa ou parente em grau distante de “autoridade” qualquer. É típica do “país dos bacharéis.”
Eu nunca usei esta expressão, mas já fui tentado algumas vezes.
Certa feita, estava na estação rodoviária de Salvador esperando minha sogra, pessoa idosa, chegar do interior do estado com caixas de preciosidades: rapadura, requeijão, carne do sol e outras iguarias mais. Na época, havia um torniquete que impedia o acesso à plataforma de desembarque, mas havia um portão lateral destinado à saída dos carregadores credenciados que trabalhavam na estação rodoviária.
Vendo minha sogra desembarcar, pedi educadamente ao funcionário que me permitisse entrar por aquele portão: “companheiro, aquela senhora é minha sogra e está precisando de ajuda com aquelas caixas...” Ele nem me deixou concluir: “meu jovem, este portão é só para desembarque...”
Insisti com minha calma costumeira e expliquei que não lhe causaria prejuízo algum, pois entraria apenas para trazer duas caixas até a parte externa e também não causaria qualquer problema para sua autoridade, mas não obtive êxito com meus argumentos.
Nisto, vejo que se aproxima de mim um Sargento da Polícia Militar, devidamente fardado, que havia comandado o destacamento de uma Comarca que eu havia trabalhado. Ao me reconhecer, o Sargento colocou sua mala no chão me saudou com a “continência” e perguntou se estava precisando de alguma coisa.
Tive muita vontade de rir da cara de surpresa do funcionário da estação rodoviária, mas me contive. Com mais humildade ainda, expliquei ao Sargento o ocorrido e este se virou com autoridade militar para o funcionário e disse que ele estava desrespeitando um Juiz de Direito e que fosse ele mesmo apanhar as caixas. Claro que não permiti e eu mesmo fiz questão de ajudar minha pobre sogra que já estava desesperada com a demora.
Na volta, o funcionário me pediu mil desculpas e observou, quase me repreendendo, que eu deveria ter dito logo que era Juiz de Direito e que tudo teria seria resolvido sem problemas. Aceitei suas desculpas, agradeci ao Sargento e fui embora. Deu tempo ainda para ouvir uma pessoa que presenciou a cena comentar: “ah! se eu fosse Juiz de Direito esse guardinha de rodoviária ia ver uma coisa!”
Deixa prá lá... Com diz o ditado: “Deus não dá asa a cobra!”
Outra vez, ainda em Salvador, imprudentemente, cometi uma infração de trânsito. Era uma famosa “roubada”, fazendo um “cotovelo” não permitido, para encurtar caminho e evitar duas demoradas sinaleiras. Nunca tinha feito aquilo antes, mas admirava quem fazia. O problema é que havia um módulo policial na praça logo em seguida à saída do “cotovelo”, mas naquele dia olhei com cuidado e não vi o policial militar de plantão.
Criei coragem e fiz o “cotovelo” com maestria e rapidez. Com mais rapidez ainda, o policial militar que estava do outro lado da rua apitou com força, apontando para meu carro e me fazendo estacionar. E agora? Fazer o quê? Flagrante...
O policial militar aproximou-se bem devagar, com aquela “marra” característica e sotaque “baianês” acentuado: “boa tarde, cidadão, documento do veículo, habilitação e documento de identidade!”
Vi que se tratava de um soldado e não tinha dúvida de que estava errado e que deveria ser punido. Agi com absoluta calma. Cumprimentei o soldado e perguntei se ele já havia multado um Juiz de Direito em sua carreira de Policial. Ele me olhou com surpresa e me perguntou a razão. Respondi então que seria aquela a sua primeira vez e lhe apresentei minha carteira de magistrado.
Não sei descrever a expressão inicial dele: surpresa, raiva, indignação, dúvida... Olhava a carteira e me olhava como se conferindo a fotografia da carteira com meu rosto. Depois de alguns segundos ele me devolveu a carteira e me disse em tom de reprovação: “Até o senhor, doutor? Tudo bem, não vou lhe multar, mas o senhor sabe que cometeu uma infração e que está errado. Pode ir embora, mas não faça mais isso, doutor.”
Agradeci sem graça e me despedi do soldado em péssimo estado moral. Melhor seria que não tivesse me apresentado como Juiz e ser multado normalmente. O comentário do policial me valeu muito mais do que a multa por infração no trânsito. Aquele “até o senhor, doutor?” ficou repercutindo em minha cabeça por vários dias.
Claro que já vivi outras situações, mas depois desses dois episódios entendi, primeiramente, que não tenho uma estrela na testa me identificando como Juiz de Direito e que o funcionário da estação rodoviária estava apenas cumprindo o que lhe foi determinado e protegendo seu emprego; em segundo lugar, que terminei constrangendo desnecessariamente um policial militar no exercício de sua função e saindo mais constrangido ainda ao me utilizar da condição de Juiz de Direito para me livrar de uma merecida multa de trânsito.
Por fim, passei a agradecer todos os dias ao constituinte que elaborou o artigo 5º, da Constituição Federal: “todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza.”
Conceição do Coité, 16 de novembro de 2008  "

O Direito Penal do Amigo do Poder

Texto copiado e colado do Blog do Juiz potiguar Rosivaldo Toscano. Veja o original aqui e passeie pelos outros excelentes textos de lá.

"O "Direito Penal do Amigo do Poder"


Dados - INFOPEN - Ministério da Justiça - Dez. 2010
"Existe um discurso alarmista e falacioso (e bem ao agrado das elites, como veremos mais abaixo) de que se deixarmos de punir criminalmente as pequenas infrações, ocorrerá o caos. Como se todas as pessoas deixassem de cometer furtos somente por causa da lei penal. Que se deixarmos de denunciar criminalmente os crimes insignificantes, haverá uma verdadeira corrida de saques aos supermercados e de danos ao patrimônio."

Há uns dias, absolvi sumária e extemporaneamente (vide aqui o que significa) um jovem miserável e dependente químico que teria furtado uma peça do compressor de uma geladeira. Valor do bem: R$ 50,00. A peça foi devidamente restituída, e na denúncia se reconhecia que a causa do furto tinha sido a dependência química do acusado. Mesmo assim, não foi pedida a aplicação de medida de segurança (clique aqui).
Dias depois, minha assistente chamou a atenção para o fato de que um dos promotores de justiça da chamada “Central de Inquéritos” apelou da decisão. É que aqui, antes do recebimento da denúncia, quem atua é uma equipe de parquets dedicada somente a essa fase da investigação, e não o promotor titular da Vara.
Na manhã seguinte, recebi um convite para ser palestrante no seminário “Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública e os Crimes Dolosos Contra a Vida”, promovido pelo Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP - em parceria com o Ministério Público do Rio Grande do Norte - MPRN. Pensei sobre o que iria dizer acerca da realidade do nosso sistema penal e quais as estratégias que teríamos que adotar para enfrentarmos esse problema. E a solução passa pelo modo com que lidamos com crimes como o do furto acima.
A impunidade nos crimes dolosos contra a vida no Brasil é gritante. Somente na Zona Norte de Natal, onde atuo, há 300 homicídios impunes. Muitos desses inquéritos há mais de dez anos sem conclusão. De outro lado, a prática que vejo é de atuação focada nos crimes contra o patrimônio, em não raros casos, situações até pitorescas, cuja atipicidade já está há muito pacificada nos tribunais superiores. Só para exemplificar, nos últimos tempos rejeitei denúncias ou absolvi sumariamente (extemporaneamente ou não) acusados em casos que tratavam de fatos como esses:
  1. Furto de 02 latas de leite em pó no valor de R$ 15,98 – bens restituídos (clique aqui);
  2. Furto tentado de dezessete calcinhas no valor individual de R$ 2,99 – bens restituídos;
  3. Furto de uma galinha, quatro câmaras de ar, dois aros de bicicleta e um pneu de bicicleta (galinha e bens devolvidos) (clique aqui);
  4. Furto mediante escalada de cinco cartões bancários (devolvidos) (clique aqui);
  5. Furto tentado de 22 barras de chocolate, num valor venal de R$ 98,50 – bens restituídos (clique aqui);
  6. Furto tentado de dois quilos de carne de charque e uma lata de azeite de oliva, avaliados em R$ 42,90 (clique aqui);
  7. Porte ilegal de uma munição percutida e não deflagrada (clique aqui);
  8. Porte ilegal de uma munição .380, um coldre e um carregador vazio (clique aqui);
  9. Porte ilegal de três munições .38 (clique aqui);
  10. Receptação de um chip de celular e suspeita de mais oito (clique aqui);
  11. Dano qualificado pelo amasso de um portão de um posto de saúde (clique aqui);
  12. Dano qualificado – arranhão em um orelhão da OI (clique aqui);
  13. Dano qualificado – acusado que tentou fugir de cela superlotada (clique aqui);
  14. Tentativa de furto de 5 desodorantes e um esmalte (clique aqui);
  15. Tentativa de furto de R$ 37,00 (clique aqui);
  16. Furto qualificado tentado, pois o acusado foi encontrado dormindo embaixo de uma das mesas do salão, agarrado a um saco preto onde se encontravam duas garrafas de uísque, uma da marca Teacher e outra da Bells. O conteúdo “subtraído” (leia-se “tomado”) foi avaliado em R$ 50,00 (clique aqui);
  17. Furto tentado de um botijão de água mineral vazio (o acusado apanhou da vítima, uma jovem senhora);
  18. Furto tentado de 10 frascos de desodorante, no valor total de R$ 89,90, das Lojas Americanas (clique aqui);
Não dá para continuar esse estado de coisas. É preciso agir com planejamento. É tempo de (re)pensar a gestão e a estrutura dos órgãos de persecução penal e definir prioridades.
A norma penal deveria existir para a tutela de apenas alguns bens ou interesses cuja especial relevância justifique ser objeto de uma tão especial, grave e qualificada proteção, como é a penal. Mas o dia-a-dia demonstra o contrário. Os dados estatísticos do INFOPEN, do Ministério da Justiça, apontam para o seguinte quadro no sistema carcerário do RN (Dez. 2010):
  • Presos por crimes contra o patrimônio: 1.730
  • Presos por crimes contra a administração pública: 8
  • Presos por tortura: 1
  • Presos por corrupção ativa: 0
Como já alertei, há mais de 300 homicídios sem solução somente na Zona Norte de Natal. Há inúmeras denúncias de tortura, e mal se ouve falar de investigações em crimes contra a Administração Pública que, normalmente, lesam os cofres públicos em (bi)milhões de reais.
De outro tanto, praticamente não existe investigação. Os crimes que nos chegam são oriundos, quase exclusivamente, de prisões em flagrante. Para que o leitor tenha uma ideia, há quase um ano não há um pedido de interceptação telefônica na Vara em que atuo. Afinal, não se precisa disso para se por atrás das grades dependentes químicos que cometem pequenos furtos.
Forma-se um círculo vicioso. O Judiciário é pautado pelo Ministério Público, haja vista o princípio da inércia. O Ministério Público, via de regra, lida somente com os inquéritos que lhe chegam da polícia civil, geralmente flagrantes em pequenas infrações contra o patrimônio. A polícia civil, por sua vez, também não investiga. A maioria avassaladora de inquéritos termina sendo oriunda prisões em flagrante realizadas pela polícia militar. E essas prisões em flagrante, é claro, não atingem a corrupção, os crimes econômicos e de inteligência e nem casos complexos como homicídios sem autoria conhecida. 
Banaliza-se o controle da criminalidade, notadamente em se tratando de crimes metaindividuais, que atingem o Estado ou toda a sociedade. Ficam livres aqueles que minam os recursos públicos que seriam utilizados para inclusão social dos mais carentes, estes últimos exatamente os alvos dos flagrantes policiais. Acabamos por punir os subintegrados ou subcidadãos (vide aqui o quesignifica).
No final das contas, quem tem o poder de dizer o que o Judiciário vai punir ou não é a polícia militar! Os Órgãos que deveriam tomar as rédeas do sistema penal andam a reboque. Por isso é tão importante pensar estrategicamente, eleger prioridades. E essas prioridades devem ter relação direta com a gravidade da infração, haja vista o impacto e a relevância dela. E acredito que a vida e a dignidade da pessoa, bem como os recursos públicos, são mais importantes que o patrimônio privado.
Existe um discurso alarmista e falacioso (e bem ao agrado das elites) de que se deixarmos de punir criminalmente as pequenas infrações, ocorrerá o caos. Como se todas as pessoas deixassem de cometer furtos somente por causa da lei penal. Que se deixarmos de denunciar criminalmente os crimes insignificantes, haverá uma verdadeira corrida de saques aos supermercados e de danos ao patrimônio. Esquecem que o sistema penal é somente mais um dos meios de controle social. 
Se formos fazer uma pesquisa sobre os motivos pelos quais alguém não comete um furto, por exemplo, a maioria das pessoas dirá que é simplesmente porque é errado, feio ou pecado (moral) e não porque é crime (direito). O controle social mais eficaz reside na família, nos meios de comunicação, na escola e na igreja. O direito penal é residual e nem de longe tem o poder que se imagina ter de controle da sociedade.
Além disso, não esqueçamos que existe o direito civil e a consequente reparação do dano. Ficar inadimplente de um crediário, por exemplo, não é crime. É mero ilícito civil. E nem por isso todas as pessoas vivem inadimplentes. Não raras vezes a inserção do nome de quem cometeu um furto insignificante no SERASA, tem muito mais eficácia. A Parte Geral do CP, que é de 1940, e ainda aplicada acriticamente, não conhecia isso. Nessas pequenas infrações, os atores jurídicos precisam descobrir outros meios de tutela que não a penal ou a prisão, e dedicar seu tempo e os recursos insuficientes para o que realmente importa: crimes que violem de maneira grave os direitos fundamentais. 
Dentro dessa visão criminalizadora míope surgem os importadores de teorias estrangeiras, construídas sob realidades sociais extremamente diferentes das nossas (notadamente em face da não superação, aqui, sequer do Estado Social). E dentre esses juristas colonizados, quais as teorias que vem logo à cabeça? A das “janelas quebradas” e a do “direito penal do inimigo”. 
A primeira reflete um paradigma já em desuso há muitos anos nos EUA e que previa que era punindo as pequenas infrações que se evitariam as grandes. Verificou-se que, na verdade, o bem-estar da economia americana é que influía na pequena criminalidade. Já a teoria do direito penal do inimigo partia do pressuposto da existência, na sociedade alemã, de alguém que não admite ingressar no Estado e assim não pode ter o tratamento destinado ao cidadão. Aqui no Brasil ocorre exatamente o contrário. A nossa luta ainda é de inclusão social de uma importante parcela dos nossos compatriotas que foi excluída à força. Resultado? Persecução penal focada nos crimes e criminosos menores.
Constrói-se, assim, o que chamo de “teoria do direito penal do amigo do poder”. Isso porque se não temos capacidade de atuar em todos os casos e terminamos por punir apenas as pequenas infrações e pequenos infratores, fazemos, sem perceber, uma escolha perversa. 
Nas profundezas desse discurso punitivo se esconde uma prática subjacente de impunidade dos poderosos, daqueles que se encontram próximos ao poder. Isso porque enquanto o Ministério Público dedica seu tempo a essa demanda pequena, os grandes criminosos aplaudem, incólumes. Regozijam-se. Deixamos com pouca efetividade o combate à corrupção, com prejuízos anuais estimados em 69 bilhões de reais/ano (vide aqui), dinheiro esse de origem pública, isto é, de todos. Dinheiro que seria usado para diminuir nossa gritante desigualdade social. Incluir gente.
Temos que separar o joio do trigo, estabelecer prioridades. Ou continuaremos nesse abraço de afogados. Isso não é racional.
Aos adoradores inconscientes do “direito penal do amigo do poder”, um alerta: você está sendo usado como inseticida social. Justiça? Ah! É só um detalhe nessa máquina louca.


*Rosivaldo Toscano Jr. é juiz de direito e membro da Associação Juízes para a Democracia - AJD"

terça-feira, 21 de junho de 2011

Zaffaroni redesenhando a execução penal.

Provando o sucesso internacional do livro Redesenhando a Execução Penal- a superação da lógica dos benefícios, meu e de outros sete defensores públicos baianos. Um flagra do penalista argentino Raul Zaffaroni fazendo uma leitura atenta, no Chile.


Link para comprar o livro aqui.

sábado, 18 de junho de 2011

O Craque. Parte 2

No início do mês, escrevi um texto sobre um jogador de futebol que havia sido punido por doping, após o uso de Crack. Confira aqui. Naquela ocasião, ele havia feito este gol, aos 46 minutos do segundo tempo, decretando o empate de 3x3 entre Bahia e Flamengo, em Salvador:



Hoje, no Rio de Janeiro, aos 47 minutos do 2º tempo, ele fez o único gol do trinfo do tricolor baiano, contra o tricolor carioca.



Para alguém que usou uma droga altamente destrutiva, que vicia no primeiro uso e que "não tem saída, além da cadeia e do caixão", ele está correndo muito e por muito tempo, não é mesmo?

Por enquanto, Jobson está servindo como grande desmitificador de uma substância que vem sendo demonizada, mas não é mais do que uma substância. Sozinha, ela não é capaz de produzir qualquer mal. Precisa de alguém que a queira usar, de determinada maneira em um determinado contexto. O problema relacionado a ela é muito mais complexo que um composto químico malígno.

No dia 21, pela Corte Arbitral do Esporte e pode ficar afastado da sua profissão por um ano e seis meses, como pena pelo envolvimento com entorpecentes. Se isto ocorrer, solucionará o problema ou somente o agravará? A resposta é mais do que óbvia e demonstra a estupidez do moralismo que permeia as políticas de drogas. Veja esta entrevista e confira.

Liberar a marcha da maconha é só um pequeno passo. Ainda falta acabar com a política de guerra as drogas. A todas elas. Guerra é guerra e sempre acaba em lágrimas.

Força, Jobson!

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Reaja, ou será morto. Reaja, ou será morta.



Acompanhei, como observador, do Fórum de Segurança Pública, do "Pacto pela vida", programa do governo estadual da Bahia. O objetivo era colher as sugestões da sociedade civil. Apesar de a idéia ser boa, a metodologia era péssima para o aprofundamento das discussões, pois cada grupo, que tratava de questões complexas, devia apresentar umas poucas diretrizes, sucintas e necessariamente vagas. Assim, não será difícil dizer que foram cumpridas, pois podem ser tudo ou nada ao mesmo tempo.

Talvez por isto, o ponto alto do evento foi quando o militante negro Hamilton Borges, muito habilmente, conseguiu criar a oportunidade para ler o manifesto do "Reaja ou será morta! Reaja ou será morto!". Quem deseja estudar seriamente a questão e ouvir, de fato, os movimentos sociais, deve prestar atenção às suas palavras, transcritas abaixo.

"Reaja ou será Morta Reaja ou será Morto

Uma Campanha Contra o Racismo, Contra o Machismo, Contra a Homofobia , Contra O sexismo , pela Vida

Algumas Considerações sobre o Projeto de Segurança Pública do Governo do Estado da Bahia em Parceria com Outros Poderes de Justiça- O Pacto Pela Vida

Frente ao Genocídio do Povo negro Nenhum Passo atrás
Salvador/ 2011

Apresentação

A Campanha Reaja é uma articulação de movimentos e comunidades de negros e negras da Capital e interior do Estado da Bahia com uma interlocução nacional com organizações que lutam contra a brutalidade policial, pela causa antiprisional e pela reparação aos familiares de vítimas do Estado ( Execuções Sumárias e extra-judiciais) e dos esquadrões da morte, milícias e grupos de extermínio.

No ano de 2005, num contexto de governo ligado a um grupo político que há décadas dominava os recursos financeiros, os meios de produção, o sistema de justiça e comunicação e que tinha no estado penal e no racismo fundamento para uma política de genocídio, nos insurgimos contra as mortes de milhares de jovens negros desovados como animais às margens de Salvador e Região Metropolitana.

Resolvemos fazer uma articulação comunitária e com os movimentos sociais e politizar nossas mortes. Colocar em evidência a brutalidade policial, a seletividade do sistema de justiça criminal que nos tinha - e ainda tem - como os bandidos padrão, sendo a cor de nossa pele, nossa condição econômica e de moradia, nossa herança ancestral e pertencimento racial a marca , a etiqueta de “inimigos a serem combatidos”.

A Campanha Reaja apresentou uma série de relatórios, informes, dossiês, denúncias e recomendações a vários organismos nacionais e internacionais como ONU, OEA, Anistia Internacional, OAB, Defensoria Pública, Comissões de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, da Assembléia Legislativa e o próprio Governo do Estado, independente de quem estivesse em seu comando, pois para nós o direito a vida e vida digna sem racismo e violência está para além da conjuntura.

Sendo assim, vimos através desse documento declarar nossa posição sobre a política em curso de segurança pública e fazer uma análise embrionária sobre o programa Pacto Pela Vida, lançado no dia 06/06/2011 pelo governo do Estado da Bahia.

Documento esse que deve ser encarado como um instrumento de diálogo que buscamos travar com o governo e os demais poderes de justiça articuladores desse programa, bem como as organizações da sociedade civil, o parlamento, e a sociedade de uma modo geral. Lembramos que em todas as oportunidades que tivemos para falar com o Excelentíssimo Senhor Governador Jaques Wagner apelamos para o fato de que só um diálogo com toda sociedade poderia ajudar a construir um outro modelo de segurança pública. Por tanto nossa exigência feita no calor de nossa ira frente aos corpos de vários jovens que tombaram durante as operações Saneamento I e II, na Chacina de Pero Vaz, na Chacina de Vitória da Conquista, na Chacina (vingança Estatal) de Cana Brava, nas mortes de Edvandro, de Djair, e Clodoaldo Souza o Negro Blul, entre outras, nos obriga a participar dessa construção de forma crítica, não tutelada e propositiva.

Apresentamos a essa plenária alguma considerações sobre segurança pública, relações raciais, sistema de justiça na sua interação com pressupostos racistas, homofóbicos e sexistas que impedem a concretização dos princípios republicanos e democráticos tão repetidos por sua excelência o Governador do Estado da Bahia Jaques Wagner listando algumas questões de extrema importância a serem consideradas pelo governo como espinha dorsal na concepção de um possível Pacto Pela Vida.

Os Pactos e Nós, Os Negros/as

Mesmo que pareça mais atraente e até seguro juntar-se ao sistema, precisamos reconhecer que agindo assim estaremos bem perto de vender nossa alma” ( Bantu Stive Biko, Escrevo o que quero , editora ática , pag.48 2ºedição 1990)

Cento e vinte e três anos depois da proclamação do pacto abolicionista “fajuto” que as elites fizeram entre si, nos tirando da condução legal de escravizados e nos empurrando para a quase perpétua exclusão dos meios de produção, de participação e do exercício de poder a que temos direito, o Estado, compreendido como os poderes de justiça, o poder legislativo, executivo e agora a defensoria pública, nos convoca a pactuarmos pela proteção da vida.

Art.5° todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade, nos termos seguintes:” (CEFB/88)

Entendemos que esse pacto, pela vida, já está expresso em nosso ordenamento jurídico e que o Constituinte Originário imprimiu no artigo 5º e esparsamente em toda nossa carta mãe, os fundamentos de um estado democrático de direito: o direito a vida e à vida digna como sua expressão máxima. Portanto, segundo várias correntes doutrinárias e o próprio corpo de juízes supremos - (STF) Guardiões da Constituição, excetuando “caso de Guerra declarada”(I,XLVII “a” Art.5º) - o valor da vida é um valor absoluto.

Porque o governo do Estado da Bahia nos convoca para um pacto pela vida? E porque as ações anunciadas pelo pacto concentram-se apenas numa suposta guerra contra o crime? Porque um governo democrático participativo e popular opera com uma lógica de lei e ordem tendo como fim a criação de um Sistema de Defesa Social?A ideologia de defesa social tem como um de seus princípios norteadores essa dicotomia entre bem (cidadão/sociedade) e mal (bandido/ criminoso/excluído), não raramente os pobres exibidos na TV como em leilão de escravos. Essa dicotomia foi apresentada por um funcionário do governo quando apresentava o pacto a militantes do Movimento Negro numa reunião chamada pela Sepromi –Secretaria de Promoção da Igualdade. Essa mesma ideologia é expressa pelo mandatário máximo do Governo da Bahia quando apela em seu discurso para o combate do bem contra o mal.

No lançamento do Programa Pacto pela Vida o Governador colocou diversas vezes a oposição do bem contra o mal como princípio do programa a nós apresentado como um pacto democrático.

No programa Balanço Geral exibido pela rede Record de televisão em 08/06/2011, conduzido pelo apresentador Raimundo Varela o governador falava na “defesa do bem contra o mal”. A julgar pelos corpos exibidos, pelos presos com suas imagens violadas nessa mesma emissora, o bem a que se refere o Governador tem origem racial , origem de classe e poder de contratar bons defensores e terem sua imagem e liberdade preservadas. E o mal ? Bem, o mal somos nós, negros e negras, a maioria da população. Não um corte ou um grupo de trabalho no governo, mas a totalidade dos interessados em um novo modelo de segurança.

Segundo Alexandre Barata:

O Principio do bem e do mal. Há um controle da criminalidade(mal) em defesa da sociedade(bem) o delito é um dano para a sociedade o delinqüente é um elemento negativo e disfuncional”(Alexandre Barata , Criminologia Critica e critica do Direito Penal , pag03 editora Rio de Janeiro /2002)

Os chamados inimigos , os maus, em sua maioria são jovens, encarcerados por crimes contra o patrimônio, crime anão, crimes de bagatela e que entopem as cadeias gerando lucros para empresas de segurança, construtoras, etc. A ideologia da defesa social quer proteger o patrimônio privado de uma criminalidade descalça, de rua, analfabeta uma criminalidade fruto da pobreza, da remoção forçada de famílias inteiras do campo, vítimas da acumulação do capital nas mãos dos herdeiros de quem fez o pacto do tráfico transatlântico de seres humanos.

Assim, consideramos os pontos que seguem de extrema relevância na composição do eixo central do Pacto Pela Vida:

1. O ordenamento jurídico já consagra a vida como um bem jurídico a ser protegido. O Pacto Pela Vida confirma o fracasso do Estado Brasileiro em garantir nossa segurança.

2. O Pacto Pela Vida não pode concentrar - se numa suposta guerra contra o crime apoiada na ideologia da defesa social e da teoria do direito penal do inimigo. Essa lógica do bem e do mal anunciada pelo governo e difundida pelo mesmo é reducionista.

3. Somos contra a instalação de um sistema de defesa social. Esse é um modelo ideológico amparado na criminalização, no etiquetamento de pobres, negros e mulheres estigmatizadas por sua relação afetiva com homens ( jovens negros) que são o principal alvo do atual sistema de segurança pública exilados nas instituições de seqüestros ( Casas de Detenção, cadeia, delegacias e etc).

4. O governo nos convoca para o Pacto Pela Vida, por que não pode esconder a tragédia humana em suas mãos. A tragédia de uma guerra cruel cuja as vitimas são negros de baixa escolaridade residindo em lugares precários. Quando não morrem são depositados nas instituições de seqüestro que dão lucros às empresas do ramo da construção civil homenageadas pelo Governador no dia 06/06/2011.

5. Nós negras e Negros do Estado da Bahia somos os principais interessados em um novo modelo de segurança que não seja racista, machista, homofóbico e sexista. Não somos um corte um grupo de trabalho.

6. O governo nos convoca para o Pacto Pela Vida por que precisa legitimar uma prática em curso de limpeza étnica, exemplificada pelos títulos das operações Saneamento I e II que levou a óbito mais de 3.000 pessoas entre 2007 e 2010, pela ação estatal da Rondesp, Choque, Caatinga, Guarnições e policias quer pela ação dos grupos de extermínio, esquadrão da morte ou pela omissão do estado.

7. Fomos surpreendidos pelo atual secretario de Segurança Publica Mauricio Barbosa com o “ Baralho ” símbolo da indignidade e da ofensa aos direitos fundamentais. O supostos criminosos exibidos no jogo de carta virtual são violados em seu direito ao principio contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal. São pessoas exibidas como culpados antes de serem processados, antes do transito em julgado.

8. O baralho da SSP é um ultraje a dignidade humana, uma repaginação dos institutos racistas de busca de africanos foragidos. O baralho deve ser retirado do sistema da SSP.

9. O governo tem que parar o incremento ao empreendimento industrial carcerário, pois criar mais cadeias não resolve o problema do crime, apenas gera mais lucro drenado para o centro do capitalismo.

10. O governo deve demolir o Presídio de Simões Filho como demonstração de respeito ao meio ambiente, o presídio viola área das comunidades tradicionais. O presídio está em área quilombola, território federal amparado pelo decreto 4887. O governador, um trabalhador do ramo químico e petroleiro sabe que os gases que passam por de baixo daquele presídio, ameaçam a vida de funcionários, presos e suas famílias.

11. O pacto Tem que sair da lógica punitiva e apresentar números de instrumentos em política cultural, política de saúde, educação, saneamento, política publica ao invés de militarização do espaço urbano.

12. O pacto tem que investir em reparação pecuniária, humanitária aos familiares das vítimas dos grupos de extermínio, esquadrão da morte e oficiais do governo.

13. O pacto tem que apresentar os números de investimentos em “ ressocialização ” “ educação ”, cultura para prisioneiros e prisioneiras.

14. O governo precisa impedir a exposição ilegal de presos em delegacias responsabilizar delegados, agentes policias, e polícias militares que expõem a constrangimento ilegal pessoas custodiadas pelo Estado.

A reaja convoca negras e negros a agirem como maioria."


sexta-feira, 10 de junho de 2011

Jogos de Poder (Battisti e o Igourte)

Acompanhei parte do julgamento de Battisti, em que o STF discutia se podia ou não obrigar o Presidente da República a extraditá-lo. Pode parecer estranho, mas lembrei de um garoto que teria roubado um iogurte e uma bicicleta. A semelhança entre o italiano que teria matado diversas pessoas e ele é que, escondidos por diversos argumentos jurídicos, ambos foram objetos do jogo de poder político.

Em setembro e outubro de 2009, a Defensoria Pública realizava um mutirão de execução penal. Eram 05 Defensores ( eu, Fabiola Pacheco, Larissa Guanaes, Lauro Azevedo e Soraia Ramos)  analisando processos e orientando 10 estagiários e alguns servidores da Secretaria de Justiça. Como eu idealizara o empreendimento, coube a mim uma espécie de coordenação informal, o que significava que eu era o primeiro a chegar e o último a sair. Meu turno, no período era de 12 horas diárias.

No meio desse turbilhão, Hélvia, nossa servidora que cuidava da organização administrativa, controle de material e das idas e vindas dos processos, pediu para eu atender uma senhora, cujo o filho tinha sido preso por roubar uma bicicleta e um iogurte. Respondi que não poderia, pois o atendimento estava suspenso. Ela insistiu: "ele foi preso por um roubo no dia seguinte ao que fez 18 anos e que aconteceu 10 anos atrás". Tive que ceder...

O processo já tinha terminado, não havia mais recurso. Conversando com a senhora, eu pensava no que poderia fazer e a única coisa maluca que me surgia à mente era ver a hora em que ele nasceu, para verificar se foi próxima da hora do delito. Pensava em uma tese de que poderia ter havido um erro do médico ou do cartório. Mas, descobri algo pior.

Realmente, ele fora pego no dia seguinte ao que completara 18 anos. Acontece que o primeiro fato, o roubo da bicicleta, acontecera uma semana antes. Ele era, portanto, menor de idade. Parecia fácil anular a pena por este fato, mas restaria o outro: o roubo de iogurte. Fiz as contas e vi que mesmo desconsiderando o caso da bicicleta, não haveria prescrição e ele continuaria preso. Por um iogurte, roubado 10 anos antes.

Levei o processo para casa e nos dias seguintes, após o mutirão das 07 às 19, trabalhava no caso das 20 às 23. Concluí que havia 02 caminhos: uma revisão criminal no Tribunal de Justiça e um pedido de indulto indivdual, ou graça (perdão), para o Presidente da República. Como não acreditava na celeridade do judiciário e tinha muitas dúvidas sobre o resultado da revisão, minhas esperanças estavam no segundo.

Preparei as peças e dei entrada nas duas, no mesmo dia. Em ambas eu dava por favas contadas o roubo da bicicleta e me preocupava com o roubo do iogurte. Na Revisão, eu alegava a insignificância do bem, para afastar a tipicidade. Sabia que os tribunais são pacíficos em dizer que roubo (diferente do furto) jamais poderia ser insignificante, então fiz uma tese alternativa. Já que o roubo exige um bem subtraído e a violencia ou grave ameaça, pedi que se considerasse insignificante o bem e o punisse apenas pela grave ameaça. A pena seria menor e estaria prescrita. Embora eu ainda hoje tenha convicção no acerto das teses que defendi, achava muito difícil que o Tribunal concordasse

Na Graça, eu alegava a desproporcionalidade e a falta de sentido na aplicação da pena 10 anos depois a alguém que roubara, quando tinha 18 anos e 01 dia, uma garrafa de iogurte. Aliás, quando foi apanhado a estava bebendo. Tentava demonstrar que o senso de humanidade do presidente devia prevalecer, pois era uma situação aberrante e cheia de especifidades, que coincidiam e formavam um caso extremamente especial: a idade, a insignificância do bem, a morosidade no julgamento, e os 10 anos depois do fato, em que não fizera nada de errado.

O pedido ao Presidente segue um trâmite. Primeiro, passa pelo Conselho Penitenciário Estadual, onde foi aprovado por unanimidade. Depois segue para a ouvidoria do Depen, diretoria do Depen, Ministério da Justiça e, aí sim, chega no Presidente. Pela organização do planalto, porém, a Casa Civil faz uma análise anterior. Foi aí que eu vi a semelhança com Battisti. Em janeiro, o processo estava na Casa Civil e fui designado para representar a Bahia, em uma reunião da Comissão Nacional de Execução Penal da Defensoria Pública, em Brasília. Aproveitei para ir  falar sobre o caso.

Ali é um espaço político, onde seria avaliada a viabilidade política de decisão. Ingenuamente, pensei que discutiria a visibilidade positiva que o presidente teria, por uma decisão histórica. De fato, a sociedade clama por penas cada vez mais duras, mas se revolta com a prisão de ladrões de galinhas ("enquanto os ricos continuam soltos"). Seria uma possibilidade de propaganda  da "bondade" do chefe da nação.

Mas, a discussão não era neste sentido. O assessor que me atendeu foi muito educado e muito prestativo. Era nítido que ele queria soltar o cara. Mas, também fazia muito bem o trabalho dele, que era proteger politicamente o presidente. Perguntou, com muita honestidade: " Se a gente solta este cara que o judiciário prendeu, você acha que eles ficarão contentes? O que Gilmar Mendes irá pensar?". Surpreso, tentei dizer que o judiciário não devia pensar nada, que era uma competência exclusiva do presidente. Mas, sabia que tinha perdido. Tinha mais gente que se achava chefe da nação e que era temida, pois poderosa.

Pelo menos, ao invés de negar, a Casa Civil devolveu o processo ao Ministério da Justiça, pedindo um parecer do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Isto provava que eles queriam conceder, mas precisavam apenas se assegurar de uma rede de apoio, para enfrentar o judiciário. O que eles desejavam era se proteger de todos os lados, para um problema político que poderia surgir.

Cinco meses depois, o processo foi apreciado pelo CNPCP. Os conselheiros estavam divididos. Parte deles queria a concessão. Outra parte, capitaneada por um desembargador, dizia que aquilo era uma afronta ao judiciário, que o defensor não poderia querer se valer da graça, para obter a soltura mais rápida e que devia aguardar o julgamento da revisão, para se necessário, recorrer ao STJ e se ainda necessário, recorrer ao STF. Caso ainda assim, a resposta fosse negativa, e somente nesta ocasião, poderia pedir  o perdão ao presidente.

Uma conselheira, que é psicóloga e não jurista, manifestou a sua perplexidade. "Eu não entendo vocês". Para prender, é um pulo, não precisa nada. Para soltar, é toda esta burocracia? Não tá todo mundo vendo, que a prisão é um absurdo?" Complemento, aguardar todo o trâmite sugerido pelos conselheiro desembargador, poderia significar o cumprimento integral da pena ( a mesma pena que todos concordavam ser aberrante).

Como resultado da divisão, eles adotaram uma solução conciliatória. Sugeririam ao presidente que decretasse a graça, mas não para extinguir a pena, como eu pedira. Para eles, a sanção deveria ser substituída por outra, restritiva de direitos. É nítido que foi uma construção, para desagradar menos o judiciário. Na essência, porém, não havia muita lógica na modificação. Se era um desrespeito mudar a decisão para extingir a pena, continuaria sendo um desrespeito mudar para reformá-la.

Mas, a graça não precisou ser concedida. Na semana seguinte, antes que o presidente soubesse do parecer do CNPCP, a revisão criminal foi julgada. Fiz a sustentação oral e, para a minha surpresa, o Tribunal de Justiça da Bahia concedeu a liberdade. Os julgadores não aceitaram as minhas teses, como eu imaginava, mas alegaram, de ofício,  que a presença de uma arma não estava tão esclarecida. Assim, reduziram a pena  de modo que houve a prescrição. Uma das maiores felicidades profissionais que tive foi ver o menino em liberdade. 

Isto não significa que errei em pedir o perdão presidencial. A graça estava pronta para ser deferida 05 meses antes. E 05 meses para quem está preso é uma eternidade. Por outro lado, se o tribunal houvesse negado, seriam mais meses ou anos, até o julgamento do recurso. Ele já estaria em liberdade, mesmo cumprindo pena restritiva de direitos, somente porque pedi a graça. Sem contar que o fato de eu ter informado, na sustentação oral, que já havia o perdão presidencial estava pronto para ser apreciado e com dois pareceres favoráveis, pode ter influenciado na decisão.

Voltando a Battisti. O ato de extradição é de competência do presidente. É um ato político, como a graça. Alguns ministros do STF, porém, queriam obrigá-lo fazer isto. A questão era, no fundo, se o judiciário tinha ou não um controle total sobre o executivo. Era um jogo de poder. Note que os três ministros que votaram pela supremacia do STF foram os 3 últimos presidentes da corte. Eles votaram, na verdade, pela supremacia deles mesmos.

Por que o presidente teve tanta coragem para enfrentar o STF, em um caso de tamanha repercussão e soltar alguém acusado de "terrorismo", mas teve tantos receios para soltar alguém acusado de roubar um iogurte? Simples, porque o primeiro era apoiado pelas esquerdas, nacional e internacionalmente, enquanto a rede de apoio político do segundo era apenas a mãe dele e um defensor público. No CNPCP não havia nenhum detento, que soubesse das dores dos seus pares, mas havia um membro do judiciário, que conhecia as angústias dos seus. A pena é um ato de força imposto sempre contra aqueles que não tem o apoio político suficiente para escapar dela.  Mais ingênuo do que eu fui é quem acredita que tudo se trata de justiça.

Ps: Com a dica de Manuel Sabino, do cada vez melhor blog Defensor Potiguar, descobri este site que me ensinou a postar os arquivos aqui. Para quem tiver curiosidade, segue a cópia da petição para o presidente. 

terça-feira, 7 de junho de 2011

Aí sim, Rio!

Defensoria pede relaxamento de prisão para os 439 bombeiros presos

Defesa entrou com pedido na Justiça Militar no início da noite desta terça.
Juíza negou no último domingo HC para um bombeiro preso após invasão.

Do G1 RJ
A Defensoria Pública do estado do Rio de Janeiro entrou, na noite desta terça-feira (7), com pedido de relaxamento de prisão e liberdade provisória para os 439 bombeiros presos. O grupo foi preso após invadir o Quartel Central da Corporação durante um protesto por aumento de salário e melhores condições de trabalho. Segundo a assessoria de comunicação da Defensoria, o pedido foi entregue à Auditoria Militar.
"O pedido de relaxamento de prisão foi feito porque, até o momento, a Defensoria não recebeu o Auto de Prisão em Flagrante dos militares, o que tornaria a prisão ilegal. Para os Defensores, a demora na comunicação não se justifica nem mesmo com o número elevado de detidos", explicou, em nota, a Defensoria Pública.
Já no pedido de Liberdade Provisória, ainda segundo a assessoria da Defensoria, "é afirmada a desnecessidade da prisão dos Bombeiros, uma vez que num Estado Democrático de Direito a regra é que o réu responda ao processo em liberdade, só podendo ser preso após a condenação transitada em julgado".
"Além disso, a prisão provisória é uma medida excepcional, não podendo ser aplicada como forma de punição antecipada", diz a nota, acrescentando que os defensores públicos "entendem que os bombeiros exercem atividade lícita e estável como servidores públicos".

No último domingo (5), a juíza Maria Izabel Pena Pieranti negou o habeas corpus a um bombeiro preso. A informação foi confirmada na tarde desta terça pelo Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), após divulgação da decisão no site do governo do estado.

Fonte http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2011/06/defensoria-pede-relaxamento-de-prisao-para-os-439-bombeiros-presos.html

"Que vergonha"! Do Blog "Assessoria Jurídica Popular"

O texto a seguir, retirado do Blog Assessoria Jurídica Popular ilustra bem o que os verdadeiros interessados pela Defensoria Pública esperam dela. Aborda as relações com o poder, a valorização dos seus membros e o reconhecimento do seu dever institucional.  Fica o alerta.
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Que vergonha!
Por Miguel lanzellotti Baldez

“Será que agora as comunidades vão precisar de advogados particulares porque não podem confiar na Defensoria Pública?” (Clara)

Vale relembrar um tanto da história desta nossa Defensoria Pública do Rio de Janeiro, nascida das entranhas do Ministério Público, passou por longo processo de democratização e foi firmando-se e aprimorando-se no tempo na mais importante onda de acesso à justiça, como reconheceram em trabalho pioneiro Mauro Capelletti e Rixa Jarth, sem dúvida o reconhecimento da necessidade de garantia do pobre, nas demandas judiciais, igualdade jurídica. Tinha sua atividade ligada à garantia individual institucionalizada, desde as legendas da vitoriosa revolução francesa, nos fundamentos igualitários do constitucionalismo brasileiro.
Um dos pontos fundamentais da Defensoria Pública do Rio de Janeiro sempre foi sua altiva postura diante do poder. Mesmo quando passou pelo tempo fechado, cruel e fascista da ditadura militar sobre ela manter-se fiel ao seu compromisso com o ofendido e humilhado povo pobre.
Bom lembrar que da resistência democrática vão surgindo na formalização de ações concretas e continuadas os movimentos populares, entre as quais importantes lutas pela posse da terra rural e da terra urbana. No campo luta contra o latifúndio e na cidade, contra a especulação imobiliária. Surgia, pois, com a organização, essa coletiva, fonte e efeito político e jurídico desse nosso ator social.
Pois a Defensoria Pública teve a sensibilidade política de criar, juntamente com a Procuradoria Geral do Estado, seu importante Núcleo de Terras e Habitação (NUTH).
Quanto à Procuradoria Geral do Estado, meteu no saco seu ilustre passado cujas práticas democráticas podem simbolizar-se em Barbosa Lima Sobrinho, Raimundo Faoro, Eduardo Seabra Fagundes e Letácio Jansen, e vendou seus olhos para as violências do Estado que, graças à divisão das competências federativas, se transformou no braço armado do governo municipal.
E a Defensoria Pública? Sem dar-se conta da natureza de sua institucionalidade constitucional, resolveu manter, por sua Defensoria Geral, com o Sr. Prefeito deste Município, diálogo supostamente democrático. Em linguagem bem popular “acreditar no papo furado” de autoridades descomprometidas com a coletividade, quando o bom exemplo está dentro da própria casa, referências democráticas como José Augusto Garcia, André de Felice, Walter Elysio, José Carlos Tortman e Maria Lúcia de Pontes são importante espelho.
Pois contraditoriamente e em benefício da ação predatória do Município, a Defensoria Geral, ao invés de reverenciar os integrantes do Núcleo de Terras e Habitação por terem sido agraciados com a honraria maior da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro – ALERJ, a medalha Tiradentes, resolveu desconsiderá-los e puni-los, sublinhando com o impróprio gesto uma desconfortável e inadmissível aliança com a Prefeitura – levando-os, com a despropositada exoneração da coordenadora do NUTH, defensora pública Roberta Fraenkel, e a abertura de procedimento administrativo contra a defensora pública Adriana Britto, por ter se manifestado no ato solene de outorga da medalha a manifestarem seus respectivos pedidos de exoneração. Todos prontamente atendidos, dispersando-se o grupo com a chamada punição geográfica, nomeou cada um deles para cidades diferentes, todas afastadas do Rio. É a isto que Boaventura de Sousa Santos chama fascismo social? Se não for não me aventuro a classificar do ato.
O NUTH, é verdade, foi preenchido com outros defensores, certamente qualificados mas sem experiência suficiente para enfrentar a bem treinada tropa de choque da Prefeitura, em cujas habilidades não se inclui compromisso com a verdade, e isso agora ficou claro. Procurados ou procurando o Sr. Secretário de Habitação do Município ouviram dele a notícia de que o despejo-remoção da comunidade Domingos Lopes, em Madureira-Campinho, seria suspenso, com certeza não seria realizado. O Defensor ouviu a notícia, acreditou nela e apressou-se em comunicar a boa nova à comunidade. O bom é que a comunidade já amadurecida nos embates com a versatilidade pouco ética da autoridade, não acreditou, e, sem contar com o apoio-dever constitucional da Defensoria Pública, recorreu a advogado particular e dele, com intervenção junto à juíza de plantão à noite, plantão muito bem exercido registre-se, obteve a democrática decisão de suspensão da remoção. Sem dúvida uma vergonha para a Defensoria Pública. Mas, por outro lado, que boa lição.
Fica a esperança, quanto à Defensoria Pública, que o Sr. Defensor Geral, que não parece homem de cultivar rancores, chame de volta ao NUTH, sem prejuízo da permanência de seus integrantes atuais, os defensores exonerados, recuperando assim a bem sucedida prática anterior, e quanto à Procuradoria Geral do Estado, que o reconhecido compromisso democrático de sua chefia a leve a apoiar o povo despossuído do Rio de Janeiro em sua luta coletiva por direitos humanos.
Difícil acalentar-se essa esperança, muito difícil mesmo, pois sobre a cidade, pairando ameaçadora, sempre está a assombração da especulação imobiliária, contumaz parceira dos poderes institucionais do Estado. "