Acabei de participar do Seminário Nacional de controle da Tuberculose do Sistema Prisional, organizado pelo Ministério da Saúde. Além dos ensinamentos que obtive dos profissionais de saúde, algumas situações me fizeram refletir.
FATO 1) Pouco interesse das autoridades políticas e jurídicas
O tema da saúde e o controle de endemias no sistema prisional é da alçada das Secretarias de Saúde e das Secretarias de Justiça dos estados. Deve ser pleiteado por defensores, controlado por juizes e fiscalizados por promotores (pelo menos em tese). Uma das maiores queixas apresentadas foi que a saúde era sempre posta em segundo plano, considerada menos importante que a ordem e a disciplina, seja na definição de políticas ou na ação judicial.
O Ministério convidou todos os secretários, bem como as representações de defensores, juizes e promotores. O número de presente destas áreas, acompanhando de fato o seminário foi:
Secretários de Saúde: 0
Secretários de Justiça: 0
Defensores Públicos: 1
Juizes: 0
Promotores: 0
O quadro é o de sempre: as autoridades só aparecem para solenidades de abertura, de encerramento, ou para proferir palestras. Raramente se dispõem a ouvir os outros. Fecham-se nos seus castelos. Depois, impõem ações sobre áreas que não conhecem nada e nem querem conhecer.
FATO 2) Diálogo entre Juiz e Profissional da saúde.
Um Juiz proferiu uma palestra. Contou uma história sobre um mutirão carcerário, no Maranhão, e depois foi questionado por alguém que vivia e trabalhava lá.
Juiz- No Maranhão, não pudemos entrar no presídio como queriamos, porque os médicos disseram não poder garantir a nossa saúde. Sequer existiam prontuários. O pior é que a situação é a mesma, após 02 anos.
Profissional da Saúde do Marnhão- Aqueles médicos não trabalhavam no sistema, mas foram levados pelos juizes. Não tinham a tarefa da avaliar a saúde dos presos, mas sim de atender aos magistrados. Os prontuários existiam há 02 anos e continuam existindo, mas ninguém nunca nos solicitou.
Percebe-se, no diálogo três coisas interessantes. Em primeiro lugar, os magistrados, que têm o dever de visitar constantemente as unidades, não deveriam precisar, por ocasião de um mutirão, pedir que médicos verificassem a salubridade do local.
Em segundo lugar, eles não ouviram os profissionais do local, demontrando a tendência exposta no fato 1.
O mais grave, porém, é que aceitaram estar diante de um local em que um juiz não podia entrar, sem riscos à saúde. Mas, se havia riscos ao juizes, havia riscos aos que trabalhavam no local e, principalmente, aos que estavam presos lá. O local deveria ser interditado. A solução, porém, foi fechar os olhos, não entrar e ir embora. Eles pensavam que o local era terrível demais para eles passarem algumas horas, mas não se importaram se pessoas continuariam a trabalhar lá diariamente e, pior, outras continuariam a viver lá.
Em tempo, o juiz chegou na hora da sua palestra e saiu assim que a terminou.
FATO 03) Roupas e Poder.
Médicos e juristas têm algumas semelhanças: suas roupas inspiram admiração e respeito, diferenciando-os dos comuns. São também dois dos poucos profissionais que, mesmo sem doutorado, são sempre chamados de doutores.
Eu , único jurista, era o único de paletó. Esperava que os médicos estivessem todos de branco. Porém eles não estavam. Fiquei pensando porque eles não usavam as suas fantasias, já que eu era obrigado a usar a minha.
Pesquisei no Google e encontrei o guia do curioso. Ele me explicou que a roupa branca facilita a visualização de sujeiras. Tá aí a diferença. A roupa deles pode ter sido criada para expressar poder, mas tem uma função prática, que termina ganhando mais relevância. Os trajes que nós juristas consideramos "condizentes com a dignidade da profissão", porém servem para apenas duas coisas: nos diferenciar dos "comuns" e dar aparência de poder.
PERGUNTA
É impressão minha ou os três fatos são muito mais conexos do que parecem?
FATO 1) Pouco interesse das autoridades políticas e jurídicas
O tema da saúde e o controle de endemias no sistema prisional é da alçada das Secretarias de Saúde e das Secretarias de Justiça dos estados. Deve ser pleiteado por defensores, controlado por juizes e fiscalizados por promotores (pelo menos em tese). Uma das maiores queixas apresentadas foi que a saúde era sempre posta em segundo plano, considerada menos importante que a ordem e a disciplina, seja na definição de políticas ou na ação judicial.
O Ministério convidou todos os secretários, bem como as representações de defensores, juizes e promotores. O número de presente destas áreas, acompanhando de fato o seminário foi:
Secretários de Saúde: 0
Secretários de Justiça: 0
Defensores Públicos: 1
Juizes: 0
Promotores: 0
O quadro é o de sempre: as autoridades só aparecem para solenidades de abertura, de encerramento, ou para proferir palestras. Raramente se dispõem a ouvir os outros. Fecham-se nos seus castelos. Depois, impõem ações sobre áreas que não conhecem nada e nem querem conhecer.
FATO 2) Diálogo entre Juiz e Profissional da saúde.
Um Juiz proferiu uma palestra. Contou uma história sobre um mutirão carcerário, no Maranhão, e depois foi questionado por alguém que vivia e trabalhava lá.
Juiz- No Maranhão, não pudemos entrar no presídio como queriamos, porque os médicos disseram não poder garantir a nossa saúde. Sequer existiam prontuários. O pior é que a situação é a mesma, após 02 anos.
Profissional da Saúde do Marnhão- Aqueles médicos não trabalhavam no sistema, mas foram levados pelos juizes. Não tinham a tarefa da avaliar a saúde dos presos, mas sim de atender aos magistrados. Os prontuários existiam há 02 anos e continuam existindo, mas ninguém nunca nos solicitou.
Percebe-se, no diálogo três coisas interessantes. Em primeiro lugar, os magistrados, que têm o dever de visitar constantemente as unidades, não deveriam precisar, por ocasião de um mutirão, pedir que médicos verificassem a salubridade do local.
Em segundo lugar, eles não ouviram os profissionais do local, demontrando a tendência exposta no fato 1.
O mais grave, porém, é que aceitaram estar diante de um local em que um juiz não podia entrar, sem riscos à saúde. Mas, se havia riscos ao juizes, havia riscos aos que trabalhavam no local e, principalmente, aos que estavam presos lá. O local deveria ser interditado. A solução, porém, foi fechar os olhos, não entrar e ir embora. Eles pensavam que o local era terrível demais para eles passarem algumas horas, mas não se importaram se pessoas continuariam a trabalhar lá diariamente e, pior, outras continuariam a viver lá.
Em tempo, o juiz chegou na hora da sua palestra e saiu assim que a terminou.
FATO 03) Roupas e Poder.
Médicos e juristas têm algumas semelhanças: suas roupas inspiram admiração e respeito, diferenciando-os dos comuns. São também dois dos poucos profissionais que, mesmo sem doutorado, são sempre chamados de doutores.
Eu , único jurista, era o único de paletó. Esperava que os médicos estivessem todos de branco. Porém eles não estavam. Fiquei pensando porque eles não usavam as suas fantasias, já que eu era obrigado a usar a minha.
Pesquisei no Google e encontrei o guia do curioso. Ele me explicou que a roupa branca facilita a visualização de sujeiras. Tá aí a diferença. A roupa deles pode ter sido criada para expressar poder, mas tem uma função prática, que termina ganhando mais relevância. Os trajes que nós juristas consideramos "condizentes com a dignidade da profissão", porém servem para apenas duas coisas: nos diferenciar dos "comuns" e dar aparência de poder.
PERGUNTA
É impressão minha ou os três fatos são muito mais conexos do que parecem?
Tem nem o que dizer... Aliás, tem sim! Gostei do desenhinho, a caricatura do início... De quem é?
ResponderExcluirAlexandre Lyrio (Wildes)
Rafson,
ResponderExcluirSobre o fato 3, "roupas e poder", recomendo, sem ter lido, e sem nem saber com certeza se o texto existe, a monografia "Te pego pela beca", de Pedro Diamantino, graduado pela UFBA, nosso contemporâneo (ou quase) de faculdade. Nunca consegui confirmar se o material existe, mas ele é seguidamente mencionado na FD-UFBA pelos alunos do movimento estudantil como um astudo estudo sobre a indumentária dos juristas. Enfim, se não existir, pelo menos é uma das melhores "lendas urbanas" acadêmicas de nossa faculdade.
Alexandre, não sei de quem é. Procurei no google uma imagem para "arrogância".
ResponderExcluirDaniel, sempre quis saber se esta monografia foi de fato apresentada. Eu cheguei a ver o próprio Pedro Diamantino falar que estava preparando ela.
abraços