Desde criança sou fanático por futebol e esportes em geral. Quando criança, não perdia um programa esportivo e adorava ler a Placar. A primeira vez que virei uma noite, foi assistindo às Olimpiadas de Seul, aos 08 anos. Uma bronca histórica que levei da minha mãe, foi quando, na mesma época, sai gritando pela casa, quando o meu Bahia de Bobô, que seria o campeão brasileiro, marcou um gol contra o São Paulo. É que a minha irmã, recém nascida, dormia, na hora e não gostou muito do barulho. Obviamente, tive o sonho de ser jogador, e depois comentarista. Não fui nada disto, mas agora tenho um blog e, desse modo, pela primeira vez, tenho o poder de publicar minha análise sobre a participação brasileira na copa! Não sei se alguém lerá, mas aí vai.
É impossível falar do Brasil em 2010, sem comparar com o Brasil em 2006. As duas seleções seriam opostas. A "seleção guerreira", de Dunga e da Brahma, foi moldada para se contrapor à seleção de estrelas desinteressadas que jogou na Alemanha. Durante muito tempo, os defensores da atual equipe disseram que ela era superior e os resultados provavam isto. Não era verdade. Tudo o que Dunga ganhou, Parreira também havia vencido (Copa América, Copa das Confederações e Eliminatórias). Com uma diferença, o time de Parreira ganhou os títulos jogando bem, enquanto o de Dunga vencia no sufoco.
Após a eliminação contra a França, em 2006, realmente se disseminou a explicação de que perdemos por falta de vontade. Nem parecia que Zidane e Henrry tinham jogado do outro lado, só não ganhamos porque os craques não quiseram. Os treinos eram todos transmitidos ao vivo e com a presença do público. Para completar, poucos dias após a eliminação, alguns jogadores teriam sido vistos em festas, o que foi considerado uma prova do descompromisso daqueles atletas. Começou a caça às bruxas. Os jogadores considerados mais talentosos foram execrados.
Este era o quadro quando Dunga foi escolhido. O capitão do tetra, um volante que marcava e gritava sem parar, simbolizava o oposto da imagem que se fazia do quadrado mágico. Ele foi contratado para construir um time de guerreiros. Ressalte-se, desde já, que não foi ele quem construiu o contexto, mas sim a imprensa. Nas suas primeiras convocações, Kaká e Ronaldinho Gaúcho, ficaram no banco. O meio campo titular tinha Daniel Cravalho e Elano. Até na numeração ele mexeu. Kaká deixou de ser o 8, Robinho deixou de ser o 7, Ronaldinho deixou de ser o 10.Todo mundo aplaudiu.
Desde o início estavam plantados os problemas que explodiram, na África do Sul. Algumas conclusões, naquela época foram completamente equivocadas, segundo o meu entedimento: 1) O Brasil não perdeu por falta de vontade, mas sim porque teve um bom adversário. 2) O Brasil não perdeu porque tinha jogadores talentosos, mas porque a França tinha jogadores talentosos. 3) A exposição excessiva dos treinos não é responsabilidade dos craques, mas sim dos dirigentes. 4) Não se pode, nem deve, exigir de ninguém que fique triste, por dias, devido a uma derrota no futebol. É até melhor que o atleta seja capaz de sorrir no dia do jogo, mostrando espírito esportivo.
O clima de guerra na Copa foi o resultado de todas as premissas equivocadas, fomentadas pela imprensa. A CBF fez uma leitura perfeita das reclamações e encontrou um treinador simbólico para atender à demanda. Ricardo Teixeira e jornalistas produziram Dunga. Ele já era assim e foi escolhido por ser assim. Se esperava dele a idéia de orgulho da pátria e luta até o fim. Até a sua convocação, embora criticada, reflete o clima pós-copa de 2006. Quem mudou de lado foi a mídia e não o técnico.
Para alimentar o espírito combativo dos seus soldados, Dunga exigia fidelidade, camaradagem, ordem e disciplina. Como qualquer instituição militar costuma fazer. Mais que isto, convenceu os soldados da existência de alguns inimigos, como toda a política de segurança pública ou segurança nacional faz, com apoio da imprensa. Assim como já foram os comunistas, já foram os terroristas, são hoje os traficantes. Para Dunga, existiram duas classes: a primeira, eliminada na convocação: "à dos craques que não ligam para a seleção". A segunda, ironicamente, foi a própria imprensa. Esta foi a surpresa. Talvez pela primeira vez, o setor que tanto trabalha para alimentar os estereótipos de viu incluído em um deles.
Não se pode dizer que foi por acaso. O trabalho dos jornalistas esportivos tem algumas características peculiares. As que mais me chamam atenção são a mistura entre informação e obrigação de torcer, informação e comércio e informação e desrespeito aos atletas e treinadores. Vou me fixar apenas na última.
Dunga chegou a chamar um jornalista de covarde e cagão de merda, durante uma coletiva, o que causou justa revolta. Mas, quantas vezes, os profissionais da imprensa dizem que um trienador é burro, um jogador é incapaz, ou ridículo? Para exemplificar, citarei um profissional que admiro bastante, Juca Kfoury. Seu comentário sobre o volante Felipe Melo, proferido no programa Linha de Passe da ESPN Brasil (meu canal favorito), no dia 02 de julho foi: "é um débil mental". Para mim, treinador e comentaristas foram igualmente ofensivos. Quem acompanha o esporte sabe que foi um caso isolado em relação ao Juca, mas não à imprensa.
Isto explica a grande aceitação pelos atletas do discurso do treinador. Assim como Dunga foi o técnico perfeito para as reclamações da imprensa, em 2006, a imprensa era um inimigo perfeito para a guerra de Dunga. O Brasil perder para a Holanda não é nenhuma catástrofe, assim como não foi perder para a França. O problema foi o precipitadíssimo desespero dos jogadores e a falta de opções para o treinador mudar o jogo. Os boleiros perderam o equilíbrio quando imaginaram que a pátria seria derrotada e seus inimigos venceriam. O técnico perdeu as opções ao excluir craques do grupo, por não se enquadrarem no perfil de soldados. O principal ausente, para mim, foi Ronaldinho Gaúcho, massacrado em 2006, pelo simples fato de não ter sido o melhor jogador do mundo, na Copa.
Preferia uma seleção que tivesse a possibilidade de encantar, com Kaká, Robinho, Ronaldinho Gaúcho, Ganso, mesmo que não jogassem todos ao mesmo tempo. Mas preferia ainda mais uma seleção pacífica, alegre. Espero que fique a lição: qualquer guerra deixa feridos, normalmente, dos dois lados e ser considerado inimigo é extremamente doloroso e revoltante.
Mais importante até do que lembrar disto no futebol, é lembrar disto na sociedade. Em 2014, os jogos serão aqui. Precisaremos resistir às exigências beligerantes da FIFA, que conseguiu interferir até na justiça penal da África do Sul, levando ao absurdo da implantação de julgamentos especiais, capazes de, em 03 dias, condenar alguém à 12 anos de prisão. A evidente irresponsabilidade retrata uma outra guerra, muito mais grave, contra o povo pobre de um país. Esta batalha deveria ter sido denunciada e criticada com todo o vigor, mas quase não se falou dela. Tomara que no Brasil o lema seja : "Uma Copa sem inimigos". Em todos os sentidos.
Rafito, meu velho, parabéns pelo aniversário e pelo belíssimo texto!
ResponderExcluirÉ verdade que em 2006 sucumbimos frente a França do gênio Zidane, o maior que vi jogar. Ainda que eu não a tenha por uma grande seleção, a só presença de Zizou chancela o seu comentário. Permita-me, contudo, discordar de uma coisa. Em 2006, caímos também pela falta de vontade. E aqui cumpre citar Bernardinho, que é preciso quando diz que "a vontade de se preparar tem que ser maior que a vontade de vencer". Em Weggis, faltou comprometimento. Ronaldo, a par de obeso, fumava na concentração (o que faz até hj, agora com o beneplácito dos dirigentes corintianos). Adriano tb se apresentou nitidamente fora de forma. São só exemplos.
A França era forte, mas talvez tivéssemos a melhor geração de talentos desde o exaltado grupo de 1982.
Acho sim que faltou respeito para com a seleção. O antídoto, todavia, veio em dosagem exacerbada na copa da África. E como todo remédio, o excesso sói ser tão ou mais pernicioso que a doença. Normal que tenha acontecido, mormente pq a humanidade usualmente opera forte em marchas e contramarchas. Ação e reação - até que se alcance um padrão ótimo (oxalá 2014)
Dunga resgatou o amor em atuar pela seleção. Esse é um mérito que não se lhe pode negar. Os erros são evidentes, máxime na convocação. Espero, entretanto, que não tenham o condão de esconder os acertos (e aqui me preocupo, pq a Globo parece ter comprado essa idéia, ante as dissidências com a comissão técnica), que tb não foram poucos.
grande abraço
Puff
Assino embaixo, especialmente essa parte:
ResponderExcluir"O clima de guerra na Copa foi o resultado de todas as premissas equivocadas, fomentadas pela imprensa. A CBF fez uma leitura perfeita das reclamações e encontrou um treinador simbólico para atender à demanda. Ricardo Teixeira e jornalistas produziram Dunga. Ele já era assim e foi escolhido por ser assim. Se esperava dele a idéia de orgulho da pátria e luta até o fim. Até a sua convocação, embora criticada, reflete o clima pós-copa de 2006. Quem mudou de lado foi a mídia e não o técnico."
Só faria a ressalva de que a seleção de Dunga, apesar de não ter dado espetáculo como a de Parreira, fez jogos muito bons, especialmente contra os grandes.
Amoêdo
Rafito, obrigado por nos haver brindado com esse belissimo texto. Concordo com quase tudo o que vc escreveu, menos com aquela parte em que deixa claro achar q a selecao de Parreira jogava mais bonito do que essa, que a seu ver so "ganhava no sufoco". Acho q ambar tiveram grandes momentos, e outros nao tao bons assim... pra citar alguns exemplos de grandes jogos que essa selecao fez: as vitorias sobre a Argentina na final da Copa America 2007 e no jogo das eliminatorias em Setembro passado, que calou bonitinho Maradona; e nesse mundial mesmo, fizemos um autentico passeio sobre Costa do Marfim e Chile. A derrota para a Holanda foi dolorosa, mas nao se pode esquecer que se trata de uma grande selecao, que ainda nao foi campea ate hj por injustica do destino...
ResponderExcluirInjustica que eu torco muito pra que se mantenha: agora meu coracao eh todo da Furia, que tb merece seu primeiro titulo mundial. Espero que Torres "entre" na Copa e ajude o resto desse timaco a derrubar a poderosa Alemanha amanha.
Um grande abraco, e Feliz Aniversario atrasado meu irmao! Grande saudade de vc.
Ticiano
Concordo que enfrentamos grandes times em 2006 e 2010. Mas da mesma forma que entendo que foram erros gravíssimos de treinadores em 2006 e 2010.
ResponderExcluirEm 2006, sempre que o "quadrado mágico" funcionou foi com Robinho + Adriano ou Ronaldo. Na Copa, colocou-se Adriano + Ronaldo. O melhor jogo, contra o Japão, foi quando Robinho jogou.
Já nas quartas, acabou-se com o quadrado e voltou-se ao "losango" com Juninho Pernambucano. Formação esta testada várias vezes nas Eliminatórias e que não havia dado certo.
Já em 2010, o erro foi na convocação, sem reservas a altura, e no destempero de Dunga. A Seleção achava que ia ganhar, por isso, quando tomou o primeiro gol, se descontrolou.
Poderíamos ter perdido às duas partidas (é do futebol) mas se não tivessemos cometido estes erros, talvez o povo brasileiro aplaudisse.