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quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Só Extraordinários. ( Jardim Gramacho e Conceição do Coité)


Lixo é aquilo que pensamos não servir para nada. São coisas que queremos que desapareçam. Vik Muniz, talvez o artista plástico brasileiro mais conceituado no mundo, percebeu que há pessoas sendo tratadas assim. Notou que há quem se considere superior e, por tabela, considere que outros são inferiores. Os últimos não prestam para nada e devem sumir da vista.

Surgiu uma idéia: mostrar que tudo serve para algo e, principalmente, que todos podem fazer algo. Para quebrar o paradigma de que existiriam pessoas naturalmente inferiores e incapazes de qualquer coisa positiva, resolveu ir a um aterro sanitário. Usando o lixo como matéria prima, faria obras de arte. Com a participação dos que vivem do lixo.

O resultado, além de belas peças, foi o documentário “Lixo Extraordinário”, concorrente ao Oscar. Os catadores viraram ao mesmo tempo artistas, obras e admiradores da arte. Três preconceitos se quebraram ao mesmo tempo: eram capazes de produzir coisas admiráveis, eram capazes de ser objeto de admiração e eram capazes de admirar produções complexas. Não é um filme para ter pena, é um filme para romper paradigmas etiológicos.

Ontem, o Jornal Nacional exibiu matéria que aproxima muito mais esta revolução da realidade cotidiana. Falava da Orquestra de Conceição do Coité. A aproximação é maior porque se trata de iniciativa em uma pequena cidade do interior baiano, sem precisar do prestígio de um renomado artista profissional. De forma amadora e sem quase nenhum recurso, atingiu o mesmo objetivo.

Com a iniciativa de uma professora da cidade, Valdete, foi fundada uma Orquestra de crianças. O dinheiro é arrecadado em uma feijoada de igreja. O maestro Josevaldo é um autodidata. Os meninos e meninas vivem e ensaiam em um dos bairros mais pobres daquela cidade. Tocam desde música regional à música erudita, quase sempre de forma instrumental. E fazem sucesso. Coité também merecia estar no cinema, disputando prêmios. Aquelas crianças produzem música, são admiradas por todos e admiram algo tão rico e difícil, como a música clássica. Não devem nada a ninguém.

O catador Sebastião, que leu Maquiavel e Nietzsche, encontrados no aterro, disse que não trabalhava com lixo, porque lixo era o que não se aproveitava. Está certo. As produções de Vik Muniz, Valdete e Josevaldo só deram certo porque as crianças como Iris, do violino, Micaela, da flauta; Letícia e André, os irmãos que explicaram ao pai a beleza do viloncelo; e os catadores como Zulu, Isis e Sebastião são pessoas, assim como eles e você, extraordinárias.





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