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domingo, 20 de novembro de 2011

Se todos fossem iguais a você (abraço, covarde, em Gerivaldo Neiva)


A Fênix preparando sua pira funerária (Hartmann Schedel, 1493)
Na última semana, em Natal, conheci pessoalmente e conversei com Manuel Sabino, Marcelo Semer e Rosivaldo Toscano, três blogueiros e juristas dos mais interessantes, preparados e inteligentes. Quando falávamos sobre as possibilidades do mundo virtual, naturalmente, falamos de Gerivaldo Neiva, que foi definido por Marcelo como "o pai dos blogs".
Gerivaldo vive um momento de dor intensa. Quando o sofrimento começou, eu lamentei muito não estar próximo para abraçá-lo e dizer a única coisa que poderia, que estava ao seu lado. Dias depois tive a oportunidade de fazer isto, mas até hoje, não tive coragem de bater em sua porta. Passado um tempo, não saberia o que dizer, nem se seria certo cumprimentar com o trivial "tudo bem?". Encontrei seu filho e fiz esta pergunta. Mas, eu sei que não está tudo bem e me sinto, então, um grande idiota.
Por isto, fiquei muito comovido quando li no seu site que ele está voltando aos poucos a ativa e quando percebi que Cláudia Gil Braz tinha dito, no facebook, o que todos nós que lemos seus textos gostariamos de dizer. Não fui capaz de olhar na face da dor alheia, mas para tentar minimizar um pouco  a minha covardia, copiei e colei, o texto que segue abaixo do blog que mais leio, gerivaldoneiva.blogspot.com (original aqui).
"Também por isso preciso continuar

Cláudia Gil Braz, 14.11.2011 *

Palavras que voam. Este foi o meu primeiro contato com o seu trabalho. Palavras que voam... Realmente voaram muito alto em minha imaginação as tuas palavras. Sou estudante de direito da UNEB, mas antes disso sou servidora pública há cinco anos... pouco tempo, mas suficiente para acabar com muitas das ilusões pueris que ainda possuem os meus amigos universitários acerca da justiça e de seus mecanismos.
Eu presencio diariamente a omissão estatal e a tristeza dos mais necessitados perante o balcão do cartório ao perguntarem “Ó minha fia, quando é que vai ter argum resultado aí da minha questão? Sabe o que é ...é que eu moro tão longe, não tenho a passagem pra vim aqui de novo não... me diga um dia certo pra eu resorver tudo...” Minha resposta, a mais educada que uma resposta desalentadora pode ser é.. “Bem senhora, lamentavelmente a Justiça (na verdade a estrutura judiciária bem distante da justiça!) tem prazos de lei que precisam correr... (cenho franzido da minha interlocutora!) explico melhor: temos que esperar quinze dias porque a lei diz assim, depois destes quinze dias, se o réu contestar ou não (novo cenho franzido!), se essa pessoa aqui, o José de Tal, não disser nada aqui no processo, o processo da senhora volta para o gabinete da Juíza.” “Ta minha fia, aí resorve né?” Depende do que o seu José de Tal disser... (Olhos cabisbaixos e a frase recorrente das pessoas idosas da zona rural que aqui passam diariamente): “É minha fia, capaz de eu morrer e não resorvê isso... tantos anos...” Tento consolá-la dizendo: “Tenha um pouquinho mais de paciência, a senhora já esperou tanto...” (palavras idiotas! Esse é exatamente o problema! – penso.) Já colocamos aqui a “etiquetinha” de prioridade na tramitação, pois a senhora é idosa e a lei determina que seu processo deve andar mais rápido... “É minha fia... ser veia serve pra arguma coisa... Se eu vim falar com a Juíza será que ela num adianta um pouquinho o meu caso?” Bem, a senhora pode vir sim, mas só depois dos quinze dias, porque aí a Juíza já pode fazer alguma coisa. “Tá bom intão... Deus lhe abençoe, pelo menos você me tratou bem... outro dia eu tive aqui no fóru e a mulher nem quis olhar nada e disse que não tinha nada pra mim porque eu já tinha vindo na semana passada... mas minha fia eu não tenho ninguém por mim, só Deus e Nossa Senhora, eu que tenho que vim, mesmo cansada e doente como eu tô. Não vou mais lhe impatá não. Segunda eu venho...”.
Paro e penso em dizer-lhe que na próxima segunda-feira ainda não estará fechado o dito prazo legal, mas reflito que na próxima segunda talvez seja uma segunda a menos na vida dela. Penso que seja melhor que ela venha, e até fale com a Juíza, quem sabe um tratamento digno e humano, uma palavra de esperança da autoridade competente, quem sabe isso sirva de alento e dê àquela senhora um novo sopro de vida, a esperança de uma resolução antes do inevitável de todos nós.
Foi essa realidade do meu dia a dia que veio ser atormentada por tuas palavras que voam. Depois foi “o celular do carpinteiro”, que “plagiando Herkenhoff” me mostrou as inúmeras possibilidades da “crônica de um crime anunciado”. Suas palavras me fizeram refletir. Refletir que estás fazendo a tua parte, “a parte que te cabe neste latifúndio” e eu me perguntei se tenho feito a minha... Apesar da pressão, apesar da desestruturação do judiciário baiano, apesar de todos os percalços (pessoais e profissionais).
Tuas palavras me fizeram enxergar que posso fazer mais no meu dia a dia. Que posso, por alguns minutos, esquecer os dissabores, a falta de estrutura. Eu posso... é injusta a sobrecarga de trabalho, eu sei, eu sinto... mas é muito menos injusto do que o tempo que o processo daquela pobre senhora se encontra parado no cartório aguardando a confecção de um mandado de citação... as palavras voam... aquela senhora já esperou muito, já foi até maltratada no balcão deste fórum por alguma outra servidora descontente e cansada da sobrecarga de trabalho, que não teve a menor paciência de explicar-lhe o rito processual de uma forma simples e direta. “O povo vem pra cá, sem saber de nada, a gente explica e eles entendem tudo errado. Pra isso é que tem advogado, tem que procurar o advogado.” Já ouvi uma servidora, com mais de vinte anos de casa, dizer a plenos pulmões a uma parte no cartório.
Não sei muito da vida... Mas já vivi algumas coisas e do que já vivi pude abstrair exatamente o que significam “as palavras que voam”. O que se apregoa por aí é que “o sistema é bruto”, mas não podemos deixar que a brutalidade nos atinja.
(Cláudia Gil Braz. Homenagem a  Gerivaldo Alves Neiva. Relembrando-nos. Abraços.

* Copiado do perfil da autora no Face Book.

Os textos mencionados pela autora: Palavras que voam, O celular do carpinteiro, Plagiando Herkenhoff e Crônica de um crime anunciado.  "

Pensei em não por música nenhuma hoje, em respeito à dor de Gerivaldo e sua família. Algo como um minuto de silêncio. Mas, creio que o melhor é mostrar agora o que nós sentimos e a importância que ele tem para nós.



quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Juustiça?

Texto extraído do Xad Camomila, excelente como todo o conteúdo do Blog da Conciliaç

http://scmcampinas.blogspot.com/2011/11/justica.html

" Justiça?

É preciso acordar e ver que o processo judicial serve como um meio muito pródigo para aquele que não tem razão. Ir a juízo é um martírio para quem tem um bom direito e depende do Judiciário para adaptar um débito bancário, por exemplo, a patamares conformes com a lei.


por Márcio Mello Casado*

"A vida de um processo
Qualquer ação de cunho contencioso, a tal “briga na justiça”, se não houver alguma espécie de acordo no meio do caminho, deverá ter uma duração média de uma década, considerando-se a data da propositura da demanda e a entrega do bem objeto do litígio ao vencedor. Nesse período, o processo passará algumas vezes pelos tribunais estaduais. Outras tantas pelo Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal.

A justiça funciona mais ou menos assim: (a) o primeiro passo é a petição inicial, na qual o autor da demanda expõe o seu direito; (b) a contestação vem em seguida, momento no qual o réu procura refutar aquilo que o autor alegou; (c) depois, poderá haver uma audiência na qual um acordo pode ocorrer; (d) não havendo a tal composição, o processo segue, com exames periciais, prova testemunhal, etc; (e) o derradeiro passo é a sentença, a qual é proferida por um juiz de primeira instância (aquele juiz que fica no Fórum); (f) após a sentença poderá haver recursos de apelação ao Tribunal Estadual, onde Desembargadores irão examinar a causa de novo; (g) e os últimos passos são os julgamentos dos recursos nos Tribunais Superiores (Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal).


Parece simples, não? Pois é, parece. Todavia, entre a letras “a” e “g” podem ocorrer uma gigantesca quantidade de incidentes. Se a petição inicial contiver um pedido de liminar, havendo ou não deferimento do pedido, poderá haver um recurso ao tribunal estadual. E esse recurso chegará ao tribunais superiores (STF e STJ), enquanto em primeira instância o processo poderá ficar suspenso ou seguir o seu caminho. Se uma prova for deferida, ou indeferida, novo recurso será cabível, e ele chegará também aos tribunais superiores. A verdade é que cada decisão que o juiz tomar no curso do processo pode (e quase sempre será) objeto de algum tipo de recurso.


É difícil avaliar se a existência de tantos momentos para recorrer é ruim. Sob a ótica de quem recorre, evidente, o juiz de primeira instância está errado. Mas isso não faz diferença alguma, porque, certo ou errado, o recurso será interposto e o processo demorará a ter uma solução final.


Mas o que é uma solução final? Ela ocorre quando não houver mais possibilidade de se recorrer da decisão de mérito (aquela decisão que disse que fulano tem razão e que beltrano deve lhe entregar alguma coisa, para ficar em um exemplo bem trivial). Esse evento chama-se trânsito em julgado.


E aí o processo se encerra? Não. Quando houver a decisão final a parte que venceu poderá executar a sentença, pois o cumprimento do julgado não é automático. Se a decisão disser que há um crédito contra o réu, o autor deve intimá-lo a pagar o tal débito. E o réu pode pagar ou simplesmente nada fazer. Em regra, nada faz. E o processo que antes recebia o nome de “ordinário” (nada mais apropriado) passa à chamada fase executiva.


E tudo começa de novo! Inclusive com novas defesas, novos recursos e nova visita do processo aos tribunais estaduais e superiores.


A essa altura é de se perguntar, um processo não termina jamais? A doutrina informa que o processo tem fim sim. A prática forense revela que ele pode não acabar jamais.


(Não vou tratar da ação rescisória que pode haver após o trânsito em julgado da decisão. Mas não custa explicar que, depois de tudo resolvido, tudo pode ser modificado por meio dessa ação própria, embora ela tenha requisitos especiais para propositura que dificultam a revisão da coisa julgada.)


Qual o processo que nunca se encerra? Após vinte anos de prática forense e alguns títulos acadêmicos que pouco significam dentro da batalha contenciosa descobri que se há dinheiro ao lado de quem não tem razão, o céu (ou o inferno, na ótica de infeliz adversário) não é o limite.


As Instituições Financeiras

O pior adversário que se pode ter em um lítigio é uma instituição financeira. Não porque tenham muito dinheiro (isso ajuda, lógico), mas porque elas agem sempre de má-fé, sem exceção. Repito: sem exceção.

Um banco, ao cobrar seus clientes na justiça, ou exige mais do que é devido ou se utiliza dos meios mais virulentos de cobrança que podem existir. Se a instituição tiver a opção de executar um contrato, pedirá a falência. Se puder penhorar um imóvel, pedirá a penhora on-line do dinheiro do devedor. Para quem não sabe, penhora on-line é um procedimento eletrônico no qual o Banco Central do Brasil serve como uma central que distribui as ordens judicias aos bancos, bloqueando os saldos das contas das pessoas, físicas ou jurídicas. Trata-se de um método quase instantâneo de cobrança se você for uma pessoa normal (mais tarde veremos que isso só funciona com você ou com sua empresa, se o devedor for uma instituição financeira, não funciona não).


Mas porque afirmo que bancos estão sempre de má-fé? Não só porque agem da forma acima, mas porque sabem que estão errados e insistem naquilo que é excessivo, pois são poucos os que reclamam. Basta visitar o site do Superior Tribunal de Justiça para ver o que um banco pode cobrar ou não (www.stj.jus.br). Agora, olhem os seus contratos e vejam que boa parte do que lá está consagrado como ilegal está sendo cobrado de você, nesse momento.


Bancos não têm acesso à internet? Não conhecem as leis? Evidente que sim. Mas que diferença isso faz? Nenhuma. Pode ser que um ou outro cliente reclame, mas a maioria se entrega, não tem força para debater. Engole o ilícito, faz o seguro que o gerente acabou de lher impor e renova o cheque especial.


Aquele que for para a justiça reclamar da ilegalidade irá se incomodar muito. Irá ganhar a demanda se sobreviver ao tempo. Mas terá que passar por restrições cadastrais, visitas de oficiais de justiça, custas processuais, honorários de advogado e mais um sem número de coisas que desanimam qualquer mortal.


O processo demorará anos. Receberá a pecha de mau pagador a cada página das petições da instituição financeira. E, quando tudo terminar, pode ocorrer algo não tão incomum aos sobreviventes: não só o devedor venceu a ação como descobriu que, ao invés de ser devedor, é credor da instituição financeira.

E agora?

O cliente que se descobre credor de uma instituição financeira não tem a vida fácil. Tudo bem, ele tem o título executivo judicial que lhe possibilita penhorar bens do banco. Ótimo, maravilhoso, quero ver cumprir...

O caminho óbvio do cliente credor é pedir ao juiz o cumprimento da sentença (título executivo judicial). Isto é, intimar o banco a pagar o débito. Dinheiro não faltará, imaginará o tolo cliente.


É aí que se descobre que um banco, quando executado, não paga, não indica bens à penhora (e se indica, nunca é dinheiro) e faz de tudo para fugir de suas obrigações. Se o juiz ordena uma penhora on-line contra um banco a diversão é garantida. Um circo é armado. E os palhaços são o cliente e o pobre do juiz que deu a ordem.


Bancos nunca têm dinheiro! A maior parte não tem conta-corrente. Afirmam nos processos, sem qualquer pudor, que o dinheiro que tem é dos clientes. E os poucos recursos que a instituição financeira tem constituem-se em reserva bancária (essa palavra mágica significa que o dinheiro do banco está no Banco Central, em bem apertado resumo).


Tudo que se lê sobre os lucros fantásticos nos jornais ou nos balanços dos bancos desaparece nos processos. São uns coitados. E não se pense que são só os bancos privados que fazem chacota do Poder Judiciário, os estatais ou de economia mista são bem piores. Aí eles usam outro argumento cretino: são instituições de interesse público. Tadinhos. E cumprir uma decisão judicial não é de interesse público?


Se for uma empresa arrendadora a penhora on-line até ocorre. Mas o dinheiro não chega às mãos do juízo, na conta judicial destinada para o processo. É que a arrendadora, do mesmo grupo do Banco onde a conta corrente foi bloqueada, não transfere o dinheiro. Exato, a decisão judicial não é cumprida, deliberadamente. E aí se descobre que a penhora on-line só é on-line para nós, mortais. Um banco tem a faculdade de descumprir a ordem judicial de transferência on-line. E não adianta reclamar para o Banco Central do Brasil.


O juiz até pode ficar indignado, multar o banco, bater o pé, mas a sua ordem só será cumprida quando alguém, de dentro do banco, disser: é... agora não dá mais para segurar.


E o dinheiro, depois de muito tempo, chega à conta judicial.


Grande coisa!

Nesse momento, aquele cliente que já está de cabelos brancos, não só pela idade, mas dos sustos que tomou no curso da demanda, inicia um processo acelerado de calvície.

Ele cai na bobagem de pedir ao juiz que lhe entregue o dinheiro. Afinal, o processo acabou, não há mais defesa alguma do banco pendente de julgamento, senão um recurso meramente protelatório sobre a ilegalidade da penhora on-line.

O que diz a doutrina e a jurisprudência: entreguem esse dinheiro logo!


O que diz o juiz: Não. É necessário que se espere o trânsito em julgado daquele recurso protelatório. O advogado da causa questiona o juiz: Excelência, mas isso não tem o menor fundamento legal. A resposta vem seca: Doutor, o CNJ (Conselho Nacional da Justiça) está de olho, sabe como é?

Não, o advogado não sabe como é. Ele sabe que está naquele processo há quinze anos. Sabe que não há recurso algum pendente, exceção ao que não deveria ser impedimento algum. Sabe que trabalhou sério em favor de seu cliente. Sabe que os magistrados que julgaram a demanda nessa década e meia são pessoas sérias (alguns até já morreram, inclusive, que Deus os tenha).


E, acima de tudo, sabe que está cansado.

Um dia o processo acaba

O tempo passa. Mais um ou dois anos. Já não há mais recurso algum pendente de julgamento. O advogado retorna ao juiz (agora já é outro) e pede, novamente, o levantamento do dinheiro.

O juiz, sempre muito cauteloso, manda que a serventia judicial certifique que não há mais recurso algum pendente de julgamento. E o alvará é entregue ao advogado.

Em direção ao banco depositário judicial ele liga para o filho do cliente e informa que irá sacar o dinheiro. Parabéns, doutor, se meu pai estivesse aqui ficaria muito feliz.

Cadê o seu pai? Doutor, ele foi ao banco prorrogar um contrato. Acho que teremos que entrar com outra ação..."


(*) Advogado. Mestre e Doutor em Direito – PUC/SP"

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Nem f...

Nota divulgada no blog  Princípio Ativo.
Original aqui.

"Desembargador do TJ/RS e Ministério Público RS processam coletivo Princípio Ativo

4 de November de 2011 66 views Sem Comentários
No ano de 2010, como de praxe, o coletivo Princípio Ativo, por meio de seus advogados, impetrou habeas corpus (salvo conduto) para que a Marcha da Maconha ocorresse com tranquilidade, dentre os tais marcos legais teoricamente previstos na Constituição Federal de 1988.
Contudo, o juiz à época, Sr. Ícaro, indeferiu (negou) o HC, sob a alegação de que a realização da Marcha da Maconha, por si só, incentivaria o uso da erva, bem como caracterizaria, sim, apologia ao crime. E a história não parou por aí…
Naquele ano, recorremos da decisão, e em segunda instância (TJ/RS) foi-nos concedido o salvo conduto, com argumentos semelhantes ao da decisão do STF – e a Marcha da Maconha 2010 foi ótima e sem ocorrências.
Neste meio tempo, entre uma decisão e outra, publicamos em nosso sítio na internet um pequeno artigo criticando a decisão de Vossa Excelência, Sr. Ícaro, que hoje está Desembargador aqui em terras guascas.
Inconformado com a crítica produzida pelo grupo, o Sr. Desembargador registrou Termo Circunstanciado (TC), alegando ser vítima de “injúria e difamação”. O MP/RS, então, ofereceu denúncia contra os réus – neste caso, Leonardo Günther (como integrante que assina a inscrição do site) e Pedro Gil (como susposto autor do artigo) por crime contra honra de funcionário público no exercício da função (!).
Na última segunda-feira, dia 24.10.11, ocorreu a primeira audiência, com a proposta de suspensão do processo proposta pelo MP/RS. O juiz acolheu a denúncia sem ao menos lê-la – valendo dizer que, amparado em portaria flagrantemente inconstitucional baixada pelo diretor geral do Fórum Central de Porto Alegre, a audiência não foi pública.
Apoiadores do Princípio Ativo e de outros movimentos sociais tentaram acompanhar a audiência e foram impedidos de presenciar a mesma, sob forte repressão dos seguranças do Fórum.
Frente ao ocorrido, o Princípio Ativo repudia toda a forma de tentativa de criminalização dos movimentos sociais produzidas pelo Estado, em especial  do Poder do Judiciário e do Ministério Público – este último com histórico (vergonhoso, diga-se) de tentativas de desmantelar movimentos sociais no estado do Rio Grande do Sul, com apoio da Brigada Militar, dupla esta que ainda segue atuando.
Diante deste cenário, pergunta-se: num Estado de Direito, dito Democrático, não é permitido a crítica às decisões de autoridades do judiciário? Sendo assim, o desembargador que cassou a decisão do juiz singular também o teria difamado e injuriado? E aqueles que escreveram livros criticando a atual política de drogas no país, também merecem ser processados – uma vez que questionam (e provam) a total ineficiência da política proibicionista? Quem sabe não tenhamos também que processar o atual governador do estado, Tarso Genro, que já se posicionou favoravelmente a um diálogo sobre a falência da guerra às drogas?
Enquanto perguntas pertinentes como estas pairam no ar, a proposta de suspensão do processo feita pelo MP/RS inclui, além de reconhecermos que temos “culpa”, também as penas de 30 dias sem ausentar-se da comarca, 2 anos apresentando-se trimestralmente para justificar nossas atividades e uma cesta básica no valor de R$ 500,00 ou 3 meses de serviço comunitário.
Em escrito de 2005 publicado na seção de Cultura do jornal La Insignia, o humorista Millôr Fernandes tecia elogios ao Latim popular – vulgo palavrão. Dentre estes, um em especial, que, segundo o humorista, “te libera, com a consciência tranquila, para outras atividades de maior interesse em sua vida“. Assim ocorre que, quando indagados pelo juiz se aceitávamos a proposta, somente uma resposta nos foi possível:
- Nem fudendo, Excelência!
Solicitamos a todos os parceiros que lutam, no país, por uma outra ganja possível, que publiquem amplamente esta nota, manifestando apoio!"